A Origem do Taiyi Jinhua Zongzhi
O tratado alquímico “Ensinamentos Finais sobre a Flor de Ouro da Grande Unidade”, datado de aproximadamente 1700 e existindo em diferentes versões, é conhecido por sua descrição da prática de “inverter a luz” (huiguang) dentro do praticante.

Min Yide (1748-1836) colocou o Segredo da Flor de Ouro no topo do corpus textual do ramo Jingai de Longmen, onde é considerado o principal trabalho no cultivo da natureza interior.
Quando invertemos a Luz, todo o Yin e Yang, as respirações do Céu e da Terra coagulam. Isso é o que chamamos de “pensamento refinador”, “respiração purificadora” ou “Pensamento purificador”.
De acordo com as instruções para iniciar a prática, o Não-Ser parece estar dentro do Ser. No tempo devido, quando a prática é concluída e fora de nosso corpo existe outro corpo, o Ser nasce dentro do Não-Ser. A luz é verdadeira apenas com cem dias de prática focada: naquele momento, torna-se o Fogo Espiritual (shenhuo).
Depois de cem dias, a Luz se aglutina espontaneamente, e a única partícula de Verdadeiro Yang de repente gera a Pérola, do tamanho de um grão de painço.
É como quando marido e mulher se unem e há um embrião. Para atender a isso, você deve estar em estado de quiescência. A reversão da luz é o mesmo que as fases do fogo (huohou).
Jinhua Zongzhi (ensinamentos finais sobre a Flor de Ouro, p.3)
Liu Yiming
Liu Yiming (1734-1821) é um dos maiores mestres na história do Neidan. Embora suas opiniões sejam fundadas em alguns dos aspectos mais arraigados desta tradição, eles também são adversos às convenções e frequentemente não seguem os padrões aceitos. Suas obras representam, no entanto, uma das principais instâncias de uma exposição integral de doutrina na história da Alquimia Interna.
Nascido na atual província de Shanxi, Liu Yiming era um mestre Longmen da décima primeira geração e fundador de um de seus ramos do noroeste. Suas obras incluem comentários a textos dO Neidan, o Daode Jing (Livro do Caminho e da Virtude), o Yijing (Livro das Mutações) e textos budistas; trabalhos independentes em Neidan; e um comentário volumoso ao romance Ming, Xiyou ji (Viagem ao Oeste), explicado à luz de Neidan. Liu Yiming propõe uma interpretação radicalmente espiritual das fontes escriturísticas de sua tradição. Na passagem traduzida aqui a Abertura da Barreira Misteriosa (xuanguan yiqiao), o centro imaterial do ser humano onde todo o processo alquímico ocorre.
A escrita de Liu Yiming é caracterizada pela profundidade doutrinária e o uso de uma linguagem simples, uma combinação de características que é raro na literatura do Neidan.
Deixe-me dizer uma coisa. Se você quer conhecer esta Abertura, está na terra onde os seis sentidos não se fixam, no lugar onde os cinco agentes não alcançam.
“Vago e indistinto!” Dentro há uma abertura.
“Obscuro e obscuro!” Dentro há um portão.
Ele abre e fecha por si mesmo. Se você gritar, ele responde; se você bater, ele responde. Luminoso e brilhante! Completo e realizado!
Aqueles que estão iludidos estão a mil milhas de distância; aqueles que estão despertos estão bem na frente dela.
Xiuzhen biannan (Discussões sobre o cultivo da Realidade) – o principal trabalho no cultivo da natureza interior.

feto espiritual, filho do Tao, filho do Buddha, Pérola, Corpo de Diamante, Corpo de Luz, Filho do Coração e Pedra Filosofal são algumas das muitas denominações do duplo espiritual que não perece à morte.
Doutrinas e práticas da Alquimia Interna (Neidan)
Vamos entender agora de onde vem o “Segredo da Flor de Ouro”. Além de uma nova variedade de Waidan, o Cantong qi (Selo da Unidade Trina) também influenciou a formação do Neidan, cujos primeiros textos existentes datam de cerca de 700 E.C. Os autores de vários tratados do Neidan referem-se à sua doutrina como o Caminho do Elixir Dourado (jindan zhi dao).
Para entender melhor a influência do Selo da Unidade Trina acesse: https://shinjigenkan.com.br/o-caminho-do-elixir-dourado-uma-introducao-a-alquimia-taoista-parte-3/
Embora muitas vezes gostem de afirmar que sua tradição sintetiza os Três Ensinamentos (sanjiao), ou seja, Confucionismo, Budismo e Taoísmo, os componentes do Neidan são, na verdade, muito mais numerosos. Seus textos tomam emprestados ensinamentos do Daode Jing, vocabulário do Zhuang Zi, emblemas cosmológicos do Livro das Mutações, métodos da meditação taoísta primitiva, práticas fisiológicas (especialmente respiratórias) das disciplinas da Vida Nutritiva (yangsheng), visões do corpo humano da medicina tradicional, linguagem alquímica do Waidan, noções doutrinárias do Budismo e conceitos do Confucionismo e Neo-Confucionismo. O empréstimo ocorre em diferentes graus de extensão e profundidade de acordo com as várias sub-tradições e seus representantes individuais.

e pelos caracteres de Céu 天 (topo), Terra 地 (embaixo), Sol 日 (direita) e Lua 月 (esquerda).
Para entender o que são as 28 Manões Lunares acesse: https://shinjigenkan.com.br/vinte-e-oito-mansoes-lunares-astronomia-e-espiritualidade-na-antiga-china-e-japao/
As funções desses componentes principais são claramente distinguidas nos tratados doutrinários do Neidan. Em particular, seus autores apontam que os ensinamentos do Neidan só podem ser entendidos à luz daqueles do Daode Jing (que eles chamam de “a origem do Caminho do Elixir Dourado”), e que a cosmologia fornece “imagens” (xiang) que servem “para dar forma ao amorfo pela palavra, e assim manifestar o verdadeiro e absoluto Dao” (Li Daochun, final do século 13, em seu Zhonghe ji, capítulo 3).
A alquimia, portanto, usa a linguagem e as imagens da cosmologia correlativa para explicar a natureza do cosmos e sua unidade com o princípio absoluto que o gera e o regula. Seu propósito final, entretanto, é “ir além do Yin e do Yang”: imagens e metáforas jogam e têm valores e funções importantes, mas oferecem apenas suportes temporários.
Para conhecer os principais fundamentos da cosmologia correlativa confira o artigo: https://shinjigenkan.com.br/principios-fundamentais-das-cinco-artes-chinesas/
“Ação” e “Não-ação”
Vários autores enfatizam que o Elixir Interno é possuído por todo ser humano e é uma representação do próprio estado inato realizado. Liu Yiming (1734-1821) expressa essa visão da seguinte forma:
Os seres humanos recebem este Elixir Dourado do céu… Elixir Dourado é outro nome para a natureza fundamental de uma pessoa, incipiente, mas realizada (huncheng, um termo derivado do Daode jing). Não existe outro Elixir Dourado fora da natureza fundamental de uma pessoa. Todos os seres humanos têm este Elixir Dourado completo em si mesmos: ele é inteiramente realizado em todos. Não é nem mais em um sábio, nem menos em uma pessoa comum. É a semente dos Imortais e dos Budas, a raiz dos dignos e sábios.
(Comentário ao Wuzhen pian)
Pegando emprestado dois termos do Cantong qi, que por sua vez os extrai do Daode Jing, Liu Yiming frequentemente menciona “virtude superior” (shangde) e “virtude inferior” (xiade) em seus escritos. Esses dois termos estão relacionados a “não fazer” (wuwei) e “fazer” (youwei) de acordo com o Daode Jing. A virtude superior é o modo de “não fazer”: a pessoa imediatamente percebe a “realidade celestial” original (tianzhen), que nunca é afetada pela mudança e impermanência que dominam dentro do cosmos. A virtude inferior, em vez disso, é a maneira de “fazer” a prática Neidan para “retornar ao Tao”. Liu Yiming afirma, no entanto, que a última maneira, quando se trata de realização, “leva ao mesmo objetivo da virtude superior”. (Comentário ao Cantong qi)
“Inversão” e as três fases da prática do Neidan
Enquanto as práticas Neidan são estruturadas de maneiras que diferem, às vezes visivelmente, umas das outras, a ideia de “inverter o curso” (ni) é comum a todas elas. Na codificação mais comum, a prática é enquadrada como a reintegração de cada uma das substâncias primárias do ser, a saber: Essência, Sopro e Espírito (jing, qi e shen), naquele que o precede. Este processo culmina na “inversão” (huan) para o Vazio (xu, ou o Tao – uma das formulações deste processo se dá em três fases):
(1) “Refinar a Essência (jing) para transmutá-la em Sopro”;
(2) “Refinar o Sopro (qi) para transmutá-lo em Espírito”; e
(3) “Refinar o Espírito (shen) para retornar ao Vazio”.
Conforme Li Daochun (final do século 13) há uma relação desses estágios à passagem do Daode Jing que afirma: “O Tao gera o Um, o Um gera o Dois, o Dois gera o Três, o Três gera as dez mil coisas”. Na explicação de Li, os três estágios da prática Neidan consistem em reverter das “dez mil coisas” para o Tao. Desta forma, o processo gradual que caracteriza Neidan leva à realização da não-dualidade do Absoluto e do relativo.

Portanto Li nos fala de um processo que começa do Vazio (wuji) para a matéria inerte (wun), ou seja o mesmo processo hilotrópico mostrado no Mapa do Taiji (Taiji Tu). Depois explica a Alquimia como um processo de refinamento das três substâncias até o retorno ao mistério (xun) ou ao Tao/wuji. Ou seja, dessa vez explica o mesmo processo holotrópico de expansão da consciência e desenvolvimento mostrado no Mapa da Fiação Interna (Neijin Tu).
O caminho da Alquimia consiste inteiramente em imagens. Leva Chumbo e Mercúrio como substâncias, mas é preciso saber que a Essência de Chumbo e a Medula de Mercúrio nada mais são do que metáforas. É baseado nos termos Li ☲ e Kan ☵, mas é preciso saber que Kan menino e Li menina nada mais são do que termos vazios.
(Xiao Tianzhi, meados do século 13)
Cultivo da Natureza (Xing) e Existência (Ming)
Nos tempos das dinastias Song e Yuan (final dos séculos 10 a 14), a história do Neidan se identifica com as linhas de transmissão conhecidas como Nanzong (linhagem do sul) e Beizong (linhagem do norte). O iniciador de Nanzong foi Zhang Boduan (século 11), e o iniciador de Beizong foi Wang Chongyang (1112-1170). A base textual da Linhagem do Sul foi fornecida pelo Wuzhen pian (Despertar para a Realidade), uma obra poética de Zhang Boduan.
Ambas as linhagens enfatizaram o cultivo de xing e ming, que constituem duas noções centrais da Alquimia Interna. Xing se refere à Natureza original de alguém, considerada inatamente desperta, mas também obscurecida pelo funcionamento da mente no estado condicionado.
Ming denota a “impressão” que cada entidade individual recebe ao ser gerada, e que pode ou não ser atualizada na vida devido à interação de alguém com o mundo por meio do corpo e dos sentidos. Esse ming (vida) é obtido na leitura do Mapa da Astrologia Chinesa.
As linhagens do norte e do sul foram distinguidas pela prioridade relativa dada a xing ou ming no contexto de seu “cultivo conjunto” (shuangxiu).
Durante as dinastias Ming e Qing, a tradição Neidan se dividiu em várias escolas. Um dos maiores mestres dessa época foi Liu Yiming (1734-1815), que em suas obras propôs uma interpretação inteiramente espiritual de sua tradição, e a quem nos referimos no início deste artigo.

Fonte: Jinye huandan yinzheng tu
(Imagens para a Verificação do Returno do Licor Dourado ao Campo Cinábrico), por Longmei Zi, início do século 13.
O Segredo da Flor de Ouro é um dos mais conhecidos tratados da Alquimia Interna, porém de longe é o único. Existem muitos textos que complementam essa área da espiritualidade chinesa. A influência do pensamento da linhagem do norte (Beizong) ou da linhagem do sul (Nanzong) atualmente estão fundidas e se promove o desenvolvimento conjunto das práticas fisiológicas que enfatizam Ming com as práticas de ampliação da consciência que enfatizam Xing.
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